• Fomos comprar chips para habilitar nossos celulares numa espécie de hipermercado de artefatos eletrônicos.

Um jovem funcionário, muito gentil, em um inglês terrível (não que o nosso seja lá essas coisas), atende-nos.

– Queremos chips para estes celulares.

Ele começa nos pedindo o passaporte e nosso endereco residencial.

Dizemos que somos jornalistas e estamos de passagem, só temos o endereço do hotel. Na verdade, queremos os celulares para ligar para o Brasil.

– Ah, não pode. Os senhores têm de estar morando na Alemanha. E não podem ligar para fora.

Não acreditamos. Um jovem membro renitente da Stasi? Insisto. Não há jeito. Desistimos.

Dobrando a esquina, numa loja de celulares, conseguimos tudo.

Fico pensando no jovem aquele como naqueles japoneses que não acreditavam que a II Guerra tinha acabado e resistiam escondidos em ilhas remotas do Pacífico.


• Dez e meia da noite, ligam da portaria do hotel.

O funcionário, educadíssimo, mas em pânico, avisa que está apavorado com a conta telefônica.

– Os senhores estão aqui há apenas dois dias, acho que pode estar havendo um erro.

Acalmo o diligente servidor, desço à portaria e explico que somos de uma rádio, que estamos aqui para cobrir o sorteio final da Copa e que os telefonemas são, na verdade, boletins radiofônicos.

Faço um ar de calma (não sem esticar o olho para os três dígitos no fim da coluna que ele me mostra) e, então, de superioridade.

– Isto é rádio, sabe? Emoções...

  E fico imaginando a emoção do pessoal do financeiro da rádio quando a conta chegar.



• No bar do hotel, empolgados alemães assistem ao jogo entre Milan e Schalke 04.

Eu ali, neutro como um suíço, mas com minha cara latina e... golaço do Milan!

Saio de fininho, para não ser confundido com um torcedor italiano de fleugma britânica, já que não movi uma ponta de nervo na hora do gol.

Mais tarde, depois de uma voltinha, retorno ao bar. O jogo esquentou, está 3 a 2 para o Milan, e o Schalke 04 pressiona, os alemães estão algumas cervejas adiante e acima do que antes.
Penso:

– Se sair um gol do Milan agora, vou ficar mal. Muito mal.

Fui dormir. Nem sei como terminou a partida.

CYRO MARTINS FILHO, ENVIADO ESPECIAL/LEIPZIG