| 27/10/2002 21h19min
Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é o novo presidente da República. Ele foi eleito neste domingo, dia 27, na disputa em segundo turno com José Serra (PSDB). Por volta das 21h15min, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) considerou o líder da esquerda nacional matematicamente eleito com 61,44% dos votos válidos, ou 45.389.742 dos votos. O sonho de chegar ao Planalto foi conquistado na quarta vez em que se lançou candidato (ele também concorreu em 1989, 1994 e 1998), no dia em que completou 57 anos. Embora o registro aponte 6 de outubro – quando ocorreu o primeiro turno – como a data do aniversário, o petista acredita que nasceu no dia 27 , informação dada pela mãe, Eurídice. O adversário de Lula, José Serra (PSDB), estava com 38,56% dos votos válidos.
Para garantir o título de mandatário do país, o ex-torneiro mecânico e ex-líder sindical no ABC paulista adotou um tom moderado denunciado já na escolha do especialista em marketing político Duda Medonça na condução da campanha e do empresário mineiro José Alencar (PL) como vice na chapa.
A imagem do Lulinha paz e amor de 2002, que aparece com ternos bem cortados e barba e cabelos cuidadosamente aparados, surtiu efeito ainda no dia 6, quando garantiu 46,4% dos votos válidos. Mas a principal inovação petista desta campanha foi a disposição para o diálogo e a composição de alianças e apoios com partidos de campos ideológicos diversos ao do PT. Ainda no primeiro turno, o governador mineiro Itamar Franco, o ex-presidente José Sarney (PMDB) e a ex-governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PFL), apoiaram Lula. No segundo turno, o leque de aliados se ampliou com nomes como os dos presidenciáveis derrotados em 6 de outubro Anthony Garotinho (PSB) e Ciro Gomes (PPS). O presidente nacional do PDT, Leonel Brizola, e o cacique baiano Antônio Carlos Magalhães (PFL) manifestaram apoio ao petista.
Figuras ligadas ao empresariado também embarcaram na onda Lula, como o presidente nacional da Gradiente, Eugênio Staub. Postura bem diversa à do presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) em 1989, Mario Amato, que, em meio à reviravolta criada com a queda do Muro de Berlim. Na época, Amato afirmou que 800 mil empresários deixariam o país caso o petista vencesse. Naquele ano, Lula desbancou Brizola, Ulysses Guimarães (PMDB) e Paulo Maful (do então PDS) e disputou o segundo turno com Fernando Collor de Mello (então do PRN). A vitória do caçador de marajás, apoiado até pela mídia, foi garantida com 49,94% dos votos válidos. O pestista conquistou 44,23%.
Nesta campanha, apesar das alianças que poderiam indicar que o PT não governaria sozinho, o medo de um eventual governo Lula – sempre à frente das pesquisas – fez o mercado financeiro viver dias de turbulência. O que se convencionou chamar de Risco Lula foi apontando em diversos momentos como o ingrediente principal para a alta do dólar. A divisa norte-americana chegou a ultrapassar a casa dos R$ 4 (recorde que nunca alcançou no fechamento dos negócios). Nesta última semana, o dólar apresentou baixa de 4,47% e encerrou vendido a R$ 3,7350. O recuo seria o aparente endosso por parte do mercado de câmbio à vitória da esquerda. Desde o lançamento da candidatura, o PT teve de reafirmar posições quanto a juros, renegociação de dívidas dos Estados e municípios e compromissos com o superávit fiscal e inflação baixa. No dia 17 deste mês, lideranças petistas lançaram um documento elaborado em conjunto com a Bolsa de Valores do Estado de São Paulo (Bovespa) e outras 23 entidades afirmando que o governo Lula irá oferecer instrumentos para financiar a produção nacional. Tais itens já apareciam no Plano Diretor do Mercado de Capitais, elaborado pelas mesmas 24 entidades no início do ano.
Não foi só o humor do mercado que preocupou o PT quanto à eleição de seu presidente de honra. Roseana poderia ser um problema. Em março, ela aparecia nas pesquisas com 13% das intenções de voto, tecnicamente empatada com Serra (16%) e Garotinho (14%) no segundo lugar, de acordo com o Ibope, e parecia ser o nome com mais chance de ameaçar a candidatura de Lula. Mas ela não resistiu a pressões quando a empresa Lunus, da qual é sócia, enfrentou denúncia de participação em um susposto esquema de fraude na antiga Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). Na sede da empresa, foram encontrados R$ 1,34 milhões, cuja origem não foi esclarecida. No dia 13 de abril, a ex-governadora maranhense anunciou a renúncia à candidatura à Presidência. Entre o final de julho e o início de agosto, foi a vez de Ciro preocupar. Levantamentos do Ibope chegaram a mostrar o candidato do PPS na segunda posição, a apenas sete pontos de Lula. O PT não precisou se mobilizar para barrar o crescimento do adversário. Na propaganda eleitoral gratuita, Serra e Ciro protagonizaram trocas de acusações. O tucano levou a melhor e se credenciou para o segundo turno.
O método de embate utilizado por Serra contra Ciro foi novamente a arma anti-Lula no segundo turno. O Rio Grande do Sul, governado por Olívio Dutra, chegou a monopolizar o horário eleitoral gratuito a fim de mostrar o que seria o desastre do PT quando o partido é governo. No horário destinado ao PSDB, houve críticas à condução das políticas públicas de educação, saúde e segurança, entre outras, no administração gaúcha. Lula usou seu programa para homenagear a gestão de Olívio e divulgar números relativos ao crescimento econômico do Estado no período.
No dia 14, foi a vez de Regina Duarte monopolizar as atenções. A namoradinha do Brasil viveu o papel mais polêmico de sua vida ao afirmar no programa de Serra que tinha medo de mudanças no discurso de Lula e da volta da hiperinflação com a vitória do PT. Dois dias depois, Paloma Duarte foi ao programa petista dizer que o tucano estava fazendo terrorismo. Foi o que bastou para explodir a celeuma: uns disseram que Regina estava sendo tolhida da liberdade de expressão, outros responderam que também é direito de expressão criticar a artista.
Além das estrelas globais, outro nome caiu na boca do povo no segundo turno: o do vinho Romanée-Conti, cuja garrafa custa cerca de US$ 2 mil. Lula ganhou uma garrafa de Duda Medonça. O jornalista Elio Gaspari afirmou que o petista, ao defender seus interesses, não poderia degustar o vinho, que a cena era patética. Luiz Fernando Verissimo deu a resposta irônica:
– Hoje tomam um gole de Romanée-Conti, amanhã estão com delírio de grandeza, pedindo saneamento básico, habitação decente, oportunidade de trabalho e até – gentinha metida a grande não sabe quando parar – mais saúde pública, mais igualdade e caviar.
O presidenciável usou uma estratégia defensiva e afirmou que, quando tomava Capelinha, um vinho bom para fazer sagu, ninguém dava importância. Quanto ao seu governo, Lula garantiu:
– Tenho um compromisso de origem, um compromisso em minhas veias, que é o de fazer com que a classe trabalhadora, ao menos uma vez, governe este país.
Acompanhe todos os números da apuração no especial Eleições 2002.
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