| 23/11/2007 07h19min
Mesmo tendo sido substituído aos 14 minutos do segundo tempo, com tempo de sobra para se arrumar, o gaúcho Ronaldinho foi um dos últimos a deixar o vestiário da Seleção Brasileira na noite de quarta-feira, no Morumbi, após a vitória de 2 a 1 sobre o Uruguai. Sua passagem pelo corredor da zona de entrevistas do estádio foi fulminante, apesar dos gritos dos repórteres. Deu uma primeira e rápida declaração no início do corredor, em voz baixa, sem sorrir, e correu para o ônibus. Foi tão arredio no ambiente externo e agitado do Morumbi como pareceu nos 60 minutos em que tentou inutilmente fugir da competente marcação uruguaia.
Pela primeira vez, desde surgiu no Grêmio, Ronaldinho vive as agruras de ter sua posição de titular da Seleção contestada – e não apenas por parte dos críticos. Além de ter sido substituído por um modesto volante chamado Josué, Ronaldinho deixou o gramado do Morumbi ouvindo gritos de "pipoqueiro, pipoqueiro", entoados por uma torcida que àquela altura da partida tinha perdido definitivamente a paciência com a Seleção. Sobrou, então, para o homem que por dois anos consecutivos foi eleito o melhor do mundo.
– Tem que deixar ele ser feliz – defendeu o técnico Dunga, na entrevista de ontem, durante a apresentação dos indicados para destaques do futebol brasileiro. – O que ele mais gosta é de jogar futebol, mas a corda está muito apertada em cima dele.
Tão apertada que, em momentos como o desta semana, a torcida nem lembra que Ronaldinho foi dúvida para os dois jogos da Seleção. Ele chegou do Barcelona com fortes dores no tornozelo direito, passou por um tratamento intensivo, teve a companhia permanente do fisioterapeuta Luiz Rosan e chegou a fazer um teste pessoal durante o aquecimento no gramado para a partida de domingo, contra o Peru. Ele batia forte no chão para ver se a botinha protetora usada no pé resistia ao impacto. Jogou, viajou para o Brasil, continuou fora de seus padrões, mas enfrentou o Uruguai, e acabou substituído por Josué, ouvindo as vaias da torcida. Deve ser duro continuar feliz em um ambiente assim.
Não são apenas as dores, claro. Há algum tempo Ronaldinho vem reduzindo os sorrisos e as brincadeiras no ambiente da Seleção. Talvez seja efeito da idade (ele já tem 27 anos, é pai, ajuda a administrar um fortuna familiar, vive preocupado com segurança), mas é muito também das cobranças que se acumulam.
Desde os preparativos para a Copa de 2002, passando pelo desastre da campanha da Alemanha e seguindo agora com Dunga, Ronaldinho sempre ouviu a contestação de que não conseguia repetir na Seleção o bom futebol do Barcelona. É uma tese repetida quase como um mantra por quem faz restrições a ele.
Para completar, perdeu a unanimidade no próprio clube, chegou a ser vaiado e passou a ter o pódio de destaque do time dividido com um argentino de nome Messi. Não é mais nem recordista de venda de camisetas do Barcelona — o posto agora é do próprio Messi.
– O jogador é um ser humano e está sujeito a essas oscilações – explica Dunga, que considerou um lance de grande coragem ter substituído um jogador com o talento de Ronaldinho pelo volante Josué.
– Ele vem da Europa, às vezes machucado, enfrenta diferenças de fuso e temperatura e pode ter dificuldades.
É o que pode consolar Ronaldinho – e dar um pouco de esperança à torcida. Depois das férias de fim de ano, do consolo da família, talvez ele volte à Seleção no próximo ano com seu futebol devidamente recuperado. E com o velho sorriso marcando os treinos da equipe.
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