| 25/04/2006 14h39min
O doutor em Economia e professor do curso de Administração da UFRGS Paulo Zawislak acredita que a Varig pode ser salva, mas a ação precisa ser rápida. O especialista diz que não é possível prever em quanto tempo uma solução para a companhia aérea em processo de falência será encontrada, mas alerta que se a Varig perder uma parcela excessiva do mercado que ocupa hoje, não haverá condições – e nem mesmo motivos – para salvá-la.
Em entrevista online ao clicRBS Zawislak destacou que o governo pode intervir em favor da companhia aérea sem injetar dinheiro na Varig, apenas "dirigindo o encaminhamento de uma solução que leve para uma alteração de estrutura de governança e de gestão da empresa", e alertou que a falência criaria um problema de oferta nos serviços aéreos.
– A crise ainda não abalou a imagem internacional da Varig. É importante saber que a ocupação do espaço aéreo nacional depende de companhias nacionais. O fim abrupto da Varig poderia gerar um problema de inserção no mercado aeroviário.
A entrevista online foi conduzida pelas jornalistas Lenara Londero e Helena Kempf, e contou com a participação de internautas moderada por Cláudia Ioschpe. Confira abaixo a íntegra do chat.
clicRBS: O que provocou a crise da Varig?
Paulo Zawislak: O que provocou a crise da Varig foram 20 ou 30 anos de gestão inadequada, um planejamento estratégico que não estava alinhado com as novas tendências do mercado de transporte aéreo, como por exemplo, desregulamentação, o surgimento das companhias low cost-low fare, e uma estrutura enxutas.
clicRBS: Desde junho de 2005 a Varig está em processo de recuperação judicial. Quais são as pretensões estabelecidas no plano de reestruturação da empresa? Há viabilidade de salvar a companhia?
Paulo Zawislak: Há, claro. O grande desafio é conseguir atrelar mercado, estratégia, gestão, legislação e dívidas. O problema é que estas coisas todas acabam se confrontando, resolvendo um problema aqui, pode piorar um problema lá...
clicRBS: Se houve falhas de gestão, alguém deveria ser punido? É possível responsabilizar alguém?
Paulo Zawislak: É difícil que se possa punir por má gestão. A menos que se tenha provas de conduta ilegal. O que a meu ver não está em debate ainda.
clicRBS: A Varig não soube se adaptar à abertura de mercado? Por que tantas companhias conseguem oferecer tarifas mais baixas e a Varig segue com preços elevados?
Paulo Zawislak: Na verdade a gente retorna às origens da crise da Varig. A empresa foi por 50 anos praticamente monopolista, tanto no mercado nacional como, principalmente, no mercado de vôos internacionais. E nesse meio tempo houve uma mudança de perfil do consumidor que abria mão de uma suposta “qualidade de serviço” por preço baixo. É difícil transformar da noite para o dia uma empresa de um tipo de estrutura para outro.
clicRBS: E qual é, então, a parte de culpa do governo na crise das companhias aéreas brasileiras (Transbrasil, Vasp e Varig)?
Paulo Zawislak: É parcial. Os problemas de ordem público-governamentais existem para todos. Sofre realmente aqueles que não tem capacidade e rapidez de adequação. A Transbrasil e a Vasp eram pequenas se comparadas com a Varig e sofreram as conseqüências muito antes. Tendo a acreditar que as razões das falências das outras empresas têm lições interessantes à própria Varig, devido a sua semelhança.
clicRBS: Se não se pode transformar a estrutura da empresa, como fazer para salvá-la? No atual estágio em que a empresa se encontra, vale a pena?
Paulo Zawislak: Não é que não pode transformar, é difícil. Em linhas gerais, se salvar a Varig for uma meta concreta a nova lei de falências pode ter um papel importante neste processo. Separar a operação, devidamente reestruturada e com possibilidades de rentabilidade, do passivo da empresa é talvez a melhor alternativa neste estágio, onde a Varig ainda tem partes de mercado relevantes (70% do mercado internacional e 20% nacional).
clicRBS: Que tipo de lições da falência da Transbrasil e Vasp a Varig ignorou?
Paulo Zawislak: Mudança do produto oferecido, enxugamento da estrutura de custos e, principalmente, uma alteração radical na estrutura de governança da empresa.
clicRBS: Em tempos de privatização de diversas empresas públicas, o caminho contrário - a estatização da Varig - seria uma alternativa válida para salvar a companhia aérea?
Paulo Zawislak: Não é ser privada ou pública que resolve o problema da Varig. Antes de qualquer coisa é preciso ter claro qual é o conjunto de tarefas de mudança gerencial a serem realizadas.
clicRBS: Uma das soluções apresentadas para salvar a Varig da falência seria um empréstimo concedido pelo BNDES para financiar algum investidor interessado no negócio. Quais seriam os entraves para que o banco injete dinheiro na Varig?
Paulo Zawislak: O BNDES não pode emprestar para a Varig. Se for emprestar terá que ser para o investidor.
Pergunta de internauta: A Fundação Ruben Berta pode ser apontada como a responsável pela ruína da companhia aérea?
Paulo Zawislak: Não a Fundação, mas a estrutura de governança que foi posta em prática ao longo dos anos se demonstrou aberta a problemas de política interna, a dificuldade no controle gerencial e a morosidade para ações estratégicas, o que é fundamental para uma empresa moderna.
clicRBS: Que mudanças gerenciais o senhor acredita serem necessárias?
Paulo Zawislak: Vamos por itens: 1 – Composição do capital; 2 – Enxugamento da estrutura; 3 – Adoção de novas práticas de controle, de logística, de operação e de marketing; Enfim, coisas que permitam estabelecer um patamar de lucro operacional suficiente para recuperar o passivo.
Pergunta de internauta: Como usuário, o senhor optaria pela Varig, caso tivesse outra opção?
Paulo Zawislak: A opção por voar Varig atualmente está diretamente ligada a relação entre a urgência da viagem e o preço do bilhete. Se for barato para viajar de férias não teria nenhum problema.
clicRBS: Não há mais espaço para companhias que não conseguem operar em modelos de baixo custo?
Paulo Zawislak: Há espaço para companhias “premium”, mas isto tem que ficar muito claro para um nicho muito específico de mercado. O que eu não acho que exista (ainda) no Brasil. Em sendo assim, no quadro brasileiro o modelo de baixo custo é certamente o mais adequado.
Pergunta de internauta: As demais companhias aéreas terão condições de absorver a demanda de passageiros se a Varig deixar de operar?
Paulo Zawislak: No curto prazo, dificilmente as outras companhias poderão absorver a demanda da Varig. Esta é, alias, uma das fortes razões para justificar a luta pela continuidade das suas atividades.
clicRBS: Os argumentos de que a Varig é um "orgulho nacional" e "patrimônio dos brasileiros" são suficientes para que o governo invista no saneamento e recuperação da companhia aérea? Que outros motivos podem ser elencados (além da questão da demanda, que o senhor já citou)?
Paulo Zawislak: Sim, seria para proteger de um lado essas partes de mercado que ainda estão com a Varig e outro para resguardar um produto cuja crise ainda não abalou sua imagem internacional. É importante saber que a ocupação do espaço aéreo nacional depende de companhias nacionais. O fim abrupto da Varig poderia gerar um problema de inserção no mercado aeroviário.
clicRBS: O governo deve intervir e salvar a Varig?
Paulo Zawislak: Sim e não. Sim, até porque já vêm fazendo. Não, da forma como historicamente se dá dinheiro às empresas, pois tais novos recursos acabarão sendo utilizados segundo velhas práticas, justamente as que geraram a crise na empresa.
clicRBS: O senhor afirmou antes que a má gestão (e suas provas) "não está em debate ainda". Esse tipo de discussão seria válido para se entender o que houve com a companhia e como fazer para recuperá-la?
Paulo Zawislak: Este tipo de discussão é válido para encontrar uma saída já!
clicRBS: Qual é o tempo que ainda resta para que uma solução definitiva seja apresentada para a companhia? É possível fazer uma previsão?
Paulo Zawislak: Não sei exatamente o tempo que resta. Só sei que ele está diretamente relacionado ao tamanho do mercado que a Varig conseguir manter. Se cair muito abaixo de um determinado nível torna-se inviável e desnecessário tentar salva-la.
clicRBS: E de que forma o governo poderia agir para que recursos injetados na Varig não fossem mal utilizados?
Paulo Zawislak: O governo pode, tão somente, tentar dirigir o encaminhamento de uma solução que leve para uma alteração de estrutura de governança e de gestão da empresa. O que de fato irá ocorrer depende do Judiciário e dos grupos de interesse envolvidos na Varig (funcionários, credores, etc).
clicRBS: A quem interessa a falência da Varig?
Paulo Zawislak: Interessa, óbvio, às concorrentes. Neste processo todo, de certa forma elas estão ganhando tempo para se equipara e se preparar para oferecer o serviço.
clicRBS: Então o socorro não precisa ser necessariamente financeiro?
Paulo Zawislak: Não tem como não ser financeiro. O que eu acho é que não precisa
ser do governo.
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