| 16/10/2003 22h20min
Sitiado em La Paz, o grupo de pelo menos 53 brasileiros assiste de perto à pior onda de violência urbana e rural desde a restauração da democracia na Bolívia, em 1982. Apesar da tensão que ronda a cidade e das bandeiras pretas que, em sinal de luto, cobrem as bandeiras bolivianas em todas as ruas, o sentimento descrito por uma família gaúcha que está na capital boliviana é de tranqüilidade, otimismo, e emoção pela nova experiência.
Hospedados no Hotel Ritz junto com outros brasileiros, o psicanalista Edson Luiz de Sousa, 43 anos, de Porto Alegre, a mulher, a artista plástica Elida Tessler, 41 anos, e as filhas Alice, oito, e Sofia, 10, mantêm contato constante com a embaixada brasileira, aguardando a operação de resgate do governo. Impossibilitados de deixar a Bolívia, eles participaram de um chat no clicPapo na noite desta quinta, dia 16.
A família desembarcou na Bolívia na tarde do último sábado, dia 11, para participar do Siart, um evento internacional de arte contemporânea organizado pelo Museu Nacional De Arte, do qual Elida participa. O passeio acabou se transformando num drama com a explosão dos conflitos em La Paz. Nas últimas quatro semanas, 74 pessoas morreram em conseqüência dos confrontos entre manifestantes e polícia, segundo a Assembléia Permanente dos Direitos Humanos da Bolívia, a principal entidade de defesa dos direitos humanos do país. Entre as vítimas, nenhum brasileiro.
A revolta, segundo Edson, atinge toda a população. Categorias como a dos intelectuais fazem movimentos de greve de fome. Ele critica o que chama de "massacre", lamenta pelas vítimas – jovens bolivianos e campesinos – mas acredita que a maioria dos brasileiros apóia o movimento:
– É uma luta desigual: pedras e palavras contra metralhadoras e tanques. Alguns dão declarações inacreditáveis, dizendo que os campesinos mataram... mas nós todos já conhecemos esta história muito bem, não é mesmo?
Quanto a uma possível renúncia do presidente boliviano, Gonzalo Sánchez de Lozada, Edson é enfático:
– Ele vai ter que renunciar.
Apesar do medo generalizado e da comida, que começa a ficar escassa, a família gaúcha mantém a calma e acredita que tudo vai "acabar bem". Passear pela cidade, só nas redondezas do hotel. Há lugares interditados, especialmente no centro da cidade. Nesta quinta, eles conseguiram caminhar cerca de 500 metros.
Pelas pequenas Alice e Sofia, no entando, Edson não teme. Ele garante que elas entendem tudo o que se passa na cidade. Segundo ele, as duas captam imagens, depoimentos e estão escrevendo um diário de viagem.
– Vivemos um clima de cidade sitiada exatamente como na era medieval. Parece aqueles climas de guerra. Eu, Elida e minhas filhas saímos a caminhar hoje (quinta) pela manhã e compramos muitas frutas. Descobrimos um restaurante brasileiro do lado do hotel e, acreditem ou não, minhas filhas comeram arroz e feijão – conta.
O governo brasileiro já colocou à disposição dois helicópteros e um avião Hércules, da Força Aérea Brasileira (FAB), mas a representação diplomática brasileira só vai viabilizar o resgate dos brasileiros quando o risco for zero, ou mínimo. Embora o Comando da Aeronáutica considere arriscada uma operação com helicópteros, as filhas de Edson, Sofia e Alice, torcem para que os helicópteros consigam tirá-los da cidade.
– Quando cruzar a fronteira do Brasil, vou colocar uma camiseta que trouxe comigo e onde está escrito "Não existe paz com exclusão" - revela.
E, expectativas à parte, a família já faz planos para retornar à Bolívia no ano que vem:
– Iremos a todos os lugares que planejamos. Esta viagem já nos deu o que tinha que dar. As montanhas ao longe e o céu tão perto na altitude nos protegem.
VIVIANE ESPINOZAGrupo RBS Dúvidas Frequentes | Fale Conosco | Anuncie | Trabalhe no Grupo RBS - © 2009 clicRBS.com.br Todos os direitos reservados.